Apesar dos benefícios dessa expansão, País tem ainda desafios a vencer, como a qualidade do ensino de medicina e a distribuição igualitária dos profissionais, ressalta Mário Scheffer
O Brasil chegou ao fim de 2023 com 564.363 médicos diplomados, marcando 2,7 profissionais por mil habitantes. Neste ano, deve alcançar a marca de quase 600 mil numa população de 205 milhões de pessoas. O professor Mário Scheffer, da Faculdade de Medicina (FM) da Universidade de São Paulo, comenta o assunto.
“Já no ano que vem, o País vai alcançar essa marca de três médicos por habitante, ultrapassando países como Estados Unidos, Japão e China”, afirma o professor. Apesar da marca positiva, ele levanta ressalvas: “Isso pode ser uma oportunidade para o sistema de saúde, mas também lança alguns sinais de alerta, principalmente em relação à ausência de um planejamento”.
As estimativas para 2035 são de que haverá mais de 1 milhão de médicos no Brasil, quase cinco médicos por mil habitantes. Com uma expansão tão grande e acelerada, segundo o especialista, “o Brasil precisa se ocupar em discutir esses médicos no sistema de saúde”. Para ele, o crescimento da área médica precisa ser pensado para que os benefícios sejam otimizados e os problemas minimizados.
Uma das questões levantadas, por exemplo, é a distribuição dos profissionais nos sistemas públicos e privados. “O aumento do número de médicos tem levado a uma maior concentração desses profissionais em serviços de saúde privados, que não atendem os pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS)”, aponta Scheffer.
Essa questão também implica evitar a excessiva concentração de médicos nos grandes centros urbanos, que é o que tende a acontecer. “As políticas precisam pensar duplamente como melhor distribuir os profissionais e promover uma maior adesão de médicos em municípios que hoje são desprovidos desses profissionais”, complementa.
Qualificação adequada
Uma segunda questão abordada pelo professor é garantir que os médicos formados sejam bons e atendam às necessidades da população. “A marca é de 400 cursos de medicina. Isso significa que cerca de 45 mil médicos e médicas irão se formar todos os anos no Brasil e nós temos apenas hoje cerca de 20 mil vagas de residência”, comenta Scheffer. A residência é necessária para a especialização médica.
Para exemplificar a problemática, o professor comenta: “Há uma escassez de anestesiologistas em vários serviços, principalmente serviços públicos. A atenção à saúde mental, que é hoje um grande problema de saúde pública, e há também ausência de psiquiatras em muitas redes”.
Com a expansão dos cursos de medicina (quase 400 existentes), o governo autorizou a abertura de mais 95 . Para Scheffer, esse aumento deve ser regulado e submetido a critérios de qualidade: “Nos cursos dos últimos dez anos, mais de 80% dessas vagas estão em instituições privadas que precisam ser monitoradas sobre a existência adequada de campos de prática de corpo docente qualificado. E a forma como isso será avaliado precisa ser discutido”.
Ele afirma que se avalia, por exemplo, a criação de uma agência reguladora do ensino de medicina. Propostas como uma avaliação terminal ao fim do curso de seis anos ou de um sistema de credenciamento das faculdades estão em debate.